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Cirurgias de problemas na coluna sem os tradicionais longos cortes começam a se popularizar

Acesso menos agressivo diminui o tempo de internação, a quantidade de remédios usada e a demora para o paciente voltar às atividades normais

Silvia Pacheco

O ator mineiro Ílvio Amaral, 50 anos, conviveu durante muito tempo com uma hérnia de disco que lhe incomodava demais quando tinha de ficar em pé por um longo período. O problema se agravou e tornou-se insuportável durante uma temporada com uma peça no Rio de Janeiro. “Era uma dor terrível. Parecia que tinha uma agulha pinçando o nervo. Doía da coluna até o pé”, recorda o ator. Como Ílvio não podia parar com o espetáculo, tentou de tudo para aliviar a dor. Fez acupuntura, massagem, tomou injeções. Nada o fazia melhorar. “A dor era tamanha que eu não conseguia mais dormir deitado. Tinha que ficar de joelhos e me debruçar na beira da cama para dormir”, relata. Após uma peregrinação por médicos no Rio de Janeiro, o ator voltou a Belo Horizonte, onde foi submetido a um procedimento chamado de cirurgia da coluna minimamente invasiva (veja arte). A operação, uma microdiscectomia endoscópica, acabou com a dor e trouxe de volta qualidade de vida ao ator. “Fiz a cirurgia há três anos e até hoje não sinto mais nada. Faço de tudo: malho, corro e danço”, diz, entusiasmado.

A história de Ílvio é semelhante a de muitas pessoas que se veem livres de problemas na coluna com as técnicas do tratamento cirúrgico minimamente invasivo. “O método veio como uma revolução, no sentido de acessar a coluna vertebral de uma maneira menos agressiva, principalmente a região lombar, que é mais acometida pelas patologias da coluna”, esclarece o ortopedista Cristiano Menezes, especialista em cirurgia da coluna e membro da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia (SBN).

O procedimento tem diversas vantagens, se comparado à cirurgia convencional. Entre elas, o menor tempo de internação — o paciente é hospitalizado de manhã e liberado no fim da tarde, para cirurgias mais simples, ou fica, no máximo, dois dias internados, em casos mais complexos. Além disso, o paciente não necessita de terapia intensiva no pós-operatório e o tempo de recuperação é mais curto, com menor uso de analgésicos e, consequentemente, o retorno mais rápido ao trabalho. “Isso é menos da metade do que uma cirurgia convencional necessita”, compara Menezes.

Outra vantagem é que não há a necessidade de transfusão de sangue e derivados. Segundo, o ortopedista, a grande preocupação quanto à transfusão de hemoderivados — por mais que haja cuidado por parte dos bancos de sangue — é o risco iminente de uma contaminação por doenças infectocontagiosas presentes no sangue. “Nenhum dos pacientes que passam pela técnica minimamente invasiva vai precisar de sangue, enquanto, de acordo com estatísticas, até 50 % dos casos na cirurgia convencional necessitam de transfusão”, alega. Segundo Menezes, o procedimento permite que o paciente tenha sangramento inferior a 100ml, ou seja, praticamente a quantidade de sangue que a pessoa retira para fazer exames relativos a qualquer cirurgia.

Indicações específicas
De acordo com o neurocirugião Márcio Vinhal, coordenador nacional do departamento de coluna da SBN, esse conjunto de cirurgias minimamente invasivas, que podem ser endoscópicas, microscópicas ou percutâneas (através da pele), são semelhantes às convencionais. “Porém, por uma via de acesso menos invasiva”, afirma o neurocirurgião. Essa via de acesso, normalmente, não é mais a linha média da coluna — aquela ponta do osso que dá para apalpar em cima da coluna. Ela é feita a três ou quatro centímetros lateralmente à linha média, com incisões que podem variar entre 15cm e 20cm. A cirurgia é realizada com a utilização de retratores tubulares: cânulas de trabalho que variam entre 14mm e 22mm, assim como as usadas na artroscopia — para cirurgia de joelho, por exemplo — e na laparoscopia. Por meio desse tubo, o cirurgião tem acesso à coluna e à visualização de suas estruturas e do problema. “Essas técnicas nos permitem realizar desde a cirurgia mais simples, como a de hérnia de disco, até uma cirurgia mais complexa, como a de artrodese — a reconstrução de uma vértebra da coluna”.

Segundo Vinhal, o objetivo, além de curar a patologia, é claro, é minimizar ao máximo os danos musculares do paciente. “Isso faz com que a pessoa possa retornar mais rapidamente às atividades”, diz. Porém, o neurocirurgião faz questão de alertar que esses procedimentos minimamente invasivos têm indicações específicas. “O caso tem que ser muito bem diagnosticado, pois não é todo problema de coluna que pode ser resolvido com esse tipo de cirurgia”, enfatiza. Entre as contraindicações descritas pelo médico estão a existência de infecções; o uso de imunodepressivos; destruições na articulação; registros prévios de uma reação chamada de osteofitária, na qual o osso sai e comprime a raiz do nervo; e obesidade. “Cada caso deve ser bem estudado e a indicação deve ser precisa. Não é porque a cirurgia minimamente invasiva é pequena que ela não oferece riscos. Todas as operações trazem riscos”, afirma Vinhal. O ortopedista Menezes completa: “A cirurgia é indicada numa minoria dos casos, aqueles em que a pessoa não melhora com as outras formas de tratamento, como o conservador.”

Sem dor e sem corte

A servidora pública Flávia Elena Pena Pascual, 34 anos, passou por diversas consultas e exames até ser diagnosticada com uma hérnia de disco simples. Segundo a moça, mesmo seu problema não sendo tão complexo, ela teve que passar por uma minuciosa investigação até ser operada. Flávia passou por uma nucleoplastia — cirurgia minimamente invasiva percutânea — em 2004, para ficar livre das dores e poder voltar à prática de esportes. “Minha cirurgia foi rápida, sem dor e sem corte. Dois meses depois, voltei a fazer meus exercícios e as dores nunca mais voltaram. Foi fantástico”, relata.

Segundo os especialistas, os procedimentos minimamente invasivos trazem benefícios para todas as idades, principalmente para os idosos, pois são muito sensíveis às cirurgias agressivas. “Procedimento que possam levar a um sangramento maior e exijam muito tempo de internação podem gerar um risco adicional de complicações clínicas aos idosos, como uma descompensação de diabetes, um infarte, uma trombose etc.”, explica Menezes. Já a cirurgia minimamente invasiva, de acordo com os especialistas, tem um grande valor nessa faixa etária, porque permite uma recuperação mais rápida, uma alta precoce e menor risco complicação clínica.

Matéria publicada no Correio Braziliense.

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